Blog da Sietar Brasil
(INATIVO)
Por Cristiana Lobo O premiado economista e pesquisador Alfredo Behrens divide seu tempo entre as aulas de Liderança Cross-Cultural na FIA, escola de negócios situada em São Paulo, e a consultoria para executivos de grandes empresas como Bradesco, Itaú, Volkswagen, Time Warner entre outras. Com ampla experiência na bagagem, ele fez doutorado em Economia na Universidade de Cambridge e atuou como professor convidado em instituições renomadas como London Business School, Princeton University, entre outras. O professor também faz palestras online gratuitas, vale a pena ficar de olho no seu site. Autor de diversos artigos e três livros na área intercultural, ele criou cursos online sobre o tema voltados para profissionais. Nas aulas, o professor usa as escolas de samba como metáfora do estilo brasileiro de liderança. Nesta entrevista, ele compartilha sua visão sobre a gestão cross-cultural e conta mais detalhes sobre seu curso. 1) Você escolheu uma escola de samba como exemplo de liderança bem-sucedida no Brasil. Porque esta escolha? Você acha que os modelos liderança que são estudados em geral nas universidades não se adaptam a nossa realidade? A escola de samba oferece um modelo organizacional que no brasileiro desperta um nível muito maior de engajamento do que o modelo ensinado nas escolas de negócios. Uma escola de samba oferece um ambiente familiar, no qual ninguém será demitido. Os indivíduos podem dar o melhor de si porque na veneração da velha guarda está a evidência de que os colaboradores sempre terão na escola a possibilidade do reconhecimento dela, mesmo após a morte. Por isso, o colaborador pode se engajar ao máximo sem receio de dar sem receber. O estilo do líder não é tudo, mas, estando em harmonia com a cultura da escola, o estilo do líder é a garantia do lugar de cada um. 2) Quais são os principais erros de gestão de pessoas que as empresas estrangeiras cometem quando lidam com funcionários brasileiros? O erro está em pretender administrar brasileiros como se fossem estrangeiros na sua própria terra. O modelo organizacional estrangeiro é mais adequado para indivíduos autônomos, competitivos, mais objetivos e que confiam mais rapidamente nos outros, o que lhes permite trabalhar em equipes mesmo sem gostar dos outros colaboradores. Ao ignorar que o brasileiro se orienta a grupos, que demora mais em confiar em quem não conhece, que a emoção e o sobrenatural desempenham no brasileiro um papel tão importante, ou mais, do que os argumentos; a administração estrangeira, contratual e objetiva aliena o colaborador brasileiro e provoca o desengajamento. 3) Qual é a melhor forma de conseguir a maior produtividade possível no Brasil, com uma equipe de brasileiros? Como a confiança é fundamental para um bom trabalho em equipe, e o brasileiro demora mais em confiar, montar equipes de pessoas que se conheçam há mais tempo é fundamental. Diria que a melhor forma de faze-lo seria escolher líderes naturais, dar-lhes autonomia para que eles montem e administrem as suas equipes, e liberdade para os integrantes de decidirem se querem trabalhar para esse líder ou para outro. Este método asseguraria equipes coesas, alinhadas e por isso mais eficazes além de possibilitar mais alegria no trabalho. 4) E quando o brasileiro é expatriado, quais são as principais dificuldades? O brasileiro formado pelas escolas de negócios tende a ser um indivíduo com algum grau de globalização. Mas, em não totalmente deixando de ser brasileiro, ele sofreria com a menor ênfase no afetivo que predomina nas economias mais avançadas. Também sentirá falta da camaradagem e do entorno emocional. Mais importante ainda, também poderá sofrer da insegurança que deriva de ser menos destro em línguas estrangeiras e no domínio de elementos da cultura geral do país anfitrião. Poderá se sentir mais a gosto nos países que beiram o mediterrâneo. Mesmo assim, poderá sofrer com a maior agressividade que caracteriza os povos descendentes dos espanhóis. 5) Quais são as melhores formas de desenvolver competência intercultural? Pode-se aprender errando, mas não seria a melhor forma. Entre estas, a primeira seria aprender a apreciar as artes e a literatura. Esta preparação desenvolve a percepção do não explícito, ajuda a entender a dinâmica subjacente no comportamento dos estrangeiros. Como as culturas são específicas às regiões, não há uma regra geral. Para um expatriado, ou responsável por uma região, recomendaria ler romances locais, assistir a seus filmes e aprender da sua história. Já imaginou quanto mais eficaz seria um Americano no Brasil se antes de chegar tiver lido Macunaíma, assistido o filme ou pelo menos ter lido algo de Machado de Assis? 6) O que você acha do uso de testes de competência intercultural em treinamentos, conhecidos como ferramentas de assessment? Conheço vários, ao ponto de ter certificação num dos mais importantes. Ajudam mas são incompletos. São desenvolvidos em economias avançadas e privilegiam elementos da ótica local (deles). Esses testes deixam de avaliar elementos que, como a afetividade e espiritualidade do brasileiro, o tornam mais eficaz em lidar com o alto espectro das emocões num ambiente intercultural. Mesmo assim, é necessário frisar que assim como há variações regionais dentro de um país, não há eficácia em todas as culturas. Quem poderia ser eficaz numa cultura poderia não sê-lo nas outras. Por exemplo, um gaúcho seria mais eficaz do que um baiano na gestão de operacões em países de fala espanhola. Mas este tipo de conhecimento escapa dos testes de inteculturalidade. 7) Você acha que os cursos de MBAs e mestrados da área de gestão das escolas de negócios brasileiras abordam o tema da liderança cross-cultural da forma e com a profundidade adequadas? O que precisaria melhorar para preparar melhor futuros líderes globais? Certamente não se ensina na profundidade necessária, e às vezes o tema nem sequer é tratado. Há várias razões para isto. Há poucos professores competentes para tratar do assunto, e os que há - na sua grande maioria - se limitam a apresentar perspectivas estrangeiras. A produção de pensamento brasileiro na área intercultural é muito escassa. Também é escassa na América Latina – acabo de contribuir com uma resenha da atividade regional para o Routledge Handbook que será publicada neste ano. Também temos um problema de cunho social. As empresas onde o idioma inglês é língua franca selecionam executivos quase exclusivamente nas classes média-alta e alta; os que estudaram em escolas particulares. Com isto diminui a demanda sequer por ensinamentos básicos sobre interculturalidade nas escolas de negócios. Quem mais poderia contribuir à eficácia do executivo brasileiro no estrangeiro, mesmo que apenas por causa da sua garra e resiliência, seria a classe média e média baixa. Aquela que estudou em escolas públicas, por exemplo. Mas esses indivíduos não recebem treinamento e com frequencia sofrem em carreiras mais lentas. 8) Quais são seus projetos atuais/futuros? Alguma novidade? (curso, palestra, livro, webinar...). O mais novo projeto é um curso online para ensinar a administrar à brasileira. Serve para estrangeiros e os nacionais que foram ludibriados nas escolas de negócios. O curso tem 15 capítulos de uns sete minutos cada um e é acompanhado por leituras para aprofundamento. Além disso, estou disponibilizando um instrumento para medir o grau de sensibilidade adquirida sobre a informação relevante no hemisfério ocidental. É ali que a maioria dos executivos latinoa-mericanos irá trabalhar e onde o desconhecimento da cultura ocidental os fará aparecer como menos competentes. Também estou lançando uma série de webinars de uns trinta minutos ao todo, para divulgar a essência da nossa forma de ser ao trabalhar. É uma contribuição para entender a cabeça e o coração do brasileiro. Serve tanto para estrangeiros quanto para brasileiros. O primeiro webinar sobre este assunto foi produzido em inglês, em 25 de março. Há mais um programado para 8 de abril, também em inglês, e, em breve, haverá outros. Também estou programando um ciclo de webinars para treinadores em interculturalidade de executivos. Tudo isto pode ser acompanhado no meu site: www.alfredobehrens.com.br 7/4/2015 08:23:19
É muito bom ver um pesquisador brasileiro criando conteúdo para o mundo! E conteúdo de qualidade! Comments are closed.
|
Arquivos
August 2015
Categorias
All
|