Blog da Sietar Brasil
(INATIVO)
Por Cristiana Lobo
Você está convidado a seguir o Instagram da Sietar Brasil, registrado na rede como @sietarbrasil. Postamos algo novo todos os dias em inglês, para alcançar tanto brasileiros quanto estrangeiros interessados no tema e nas nossas atividades. Comentários serão sempre muito bem-vindos! A proposta é criar um fórum de troca de ideias informal e divulgar o trabalho da Sietar Brasil, além de atrair novos seguidores e avisar sobre os nossos eventos. Incluímos diversos tópicos como aspectos típicos da cultura brasileira, questionamentos sobre interculturalismo e aviso sobre o prazo de inscrição da Conferência, por exemplo. A iniciativa faz parte do reposicionamento da estratégia de comunicação, focada cada vez mais no crescimento da nossa organização. Aguardamos você por lá! Por Cristiana Lobo
Jimena Andino Dorato é coach intercultural, pesquisadora e palestrante. É argentina, mas traz na bagagem vivências bem diversificadas. Morou em Montréal, no Canadá, onde pesquisou temas relacionados a sua formação em direito na renomada McGill University. Viveu por dois anos em São Paulo, no Brasil, onde atuou sobretudo como coach intercultural. Destaca-se sua participação no trabalho da Sietar Brasil com imigrantes e refugiados na Missão Paz São Paulo. Jimena agora mora em Paris, onde pretende usar o trabalho realizado no Brasil como modelo para a Sietar Francesa. Nesta entrevista ela nos conta suas impressões sobre o treinamento realizado na Sietar Brasil. 1) O treinamento com os imigrantes na Missão Paz começou em junho de 2014. Foram diversas turmas, sendo que a maioria formada por haitianos. Você poderia contar um pouco sobre este trabalho e destacar o que você considerou mais relevante nesta experiência? Foram várias turmas e eu ministrei uma palestra por mês, o que deu um total de mais de 30 horas de treinamento. A base da minha apresentação é o trabalho que já havia começado com Naomi Yamaguchi e Mariana Barros, acrescentei alguns detalhes relacionados a minha formação em coaching e à condição de não-brasileira. No começo, além dos treinamentos em francês para a turma maior (que alguns dias chegava a mais de 100 pessoas), dava também um breve treinamento em inglês ou espanhol para não deixar os imigrantes sem a palestra. Conforme o grupo de voluntários foi crescendo, começamos a dar em paralelo um treinamento em francês no auditório e outro em inglês ou em espanhol em outra sala. Eu me concentrei na turma de francófonos de maioria haitiana. Mesmo sempre havendo uma maioria haitiana, tento ressaltar a importância da ajuda e colaboração entre as distintas culturas francófonas ou outras, procurei passar a mensagem de que é importante entender que a luta pela não discriminação começa também entre eles, ao se autoconhecerem e abrirem o seu olhar para o “outro”. Meu objetivo é fazer com que a palestra seja o mais participativa possível para que os imigrantes contem sua experiência e trabalhem a partir dos exemplos que eles trazem. Uso maioritariamente imagens, pouco texto e uma linguagem informal de transmissão de experiências e empatia. Um parte do trabalho para mim é criar um espaço para que eles possam se expressar e mesmo “desabafar” em uma língua mais próxima a deles (próxima porque geralmente o francês nem é a língua materna). A palestra ajuda os imigrantes a enxergarem alternativas e aumenta sua chance de sucesso na medida em que eles aprendem o “jeito” brasileiro sem perder sua identidade. O feedback que temos dos funcionários da Missão Paz é bem satisfatório, os imigrantes que participam da palestra conseguem uma melhor comunicação entre eles, com os funcionários e os possíveis empregadores. 2) O treinamento com os funcionários da Missão Paz, realizado em parceria com Hanna Helstela, foi diferente. Vocês criaram um programa de seis módulos e a turma era formada por apenas 13 integrantes. Este formato permitiu um trabalho diferenciado? Como foi o trabalho? Sim, o trabalho foi bem diferente. No caso dos imigrantes foi uma palestra ou intervenção única e a turma era diferente a cada vez. Com os funcionários fizemos um trabalho com base construtivista, trabalhamos com a mesma turma durante seis meses, eram 13 funcionários. A ideia começou em um treinamento do Milton Bennett aqui em São Paulo, decidimos criar um programa específico para os funcionários que aplicasse na prática o substrato teórico do DMIS de Bennett. A Hanna decidiu focar neste projeto e me convidou para trabalhar junto com ela na criação e realização do programa. Assim começamos com a primeira turma de funcionários cada última sexta-feira do mês pela tarde, entre outubro de 2014 e março de 2015. Criamos os 6 módulos para fazer um trabalho de desenvolvimento da sensibilidade intercultural focando nos 5 frameworks do Milton Bennett sem entrar nas particularidades de uma outra cultura, saindo dos clássicos “do’s” e “don’ts”. Cada módulo começou com uma apresentação teórica breve do ponto a ser trabalhado e uma revisão do módulo anterior e do processo de cada um durante o mês. Em seguida, cada tema foi abordado com diferentes dinâmicas de trabalho em grupo, como jogos, vídeos e filmes. O objetivo era que os participantes desenvolvessem uma sensibilidade intercultural sustentável. Para isso, o trabalho não termina quando o módulo acaba. O prazo de um mês entre um e outro módulo é essencial, sendo a “lição de casa” a aplicação no quotidiano do aprendizado, parte fundamental do programa. 3) Quais foram os principais desafios e benefícios do programa? Para começar, o programa teve os desafios próprios de criar um projeto do zero e de trabalhar com uma colega pela primeira vez. Com a Hanna rapidamente concordamos com o marco teórico de trabalho e como levar esta teoria para a prática de maneira empírica. Tivemos uma boa dinâmica de trabalho desde o começo. Um grande desafio foi o uso do tempo em cada módulo. Precisávamos conseguir transmitir a teoria, manter atividades lúdicas e criativas e ainda dar espaço suficiente para todos compartilharem suas experiências e dúvidas. Acho que este desafio foi também um grande benefício do programa. Foi um passo importante no desenvolvimento da sensibilidade intercultural de todos vivenciar a noção do tempo -que é um tema intercultural enorme- em uma turma com uma treinadora de cultura finlandesa-alemã, outra de cultura argentino-canadense e uma parte dos participantes brasileiros com experiências ou entornos familiares multiculturais e outra parte proveniente de distintos países da América Latina. O grande benefício do curso foi ter conseguido o objetivo principal de provocar nos participantes mudanças internas que permitiram enxergar o “outro”. Os participantes conseguiram aplicar o aprendizado não só em seu trabalho com os imigrantes, mas também entre eles. Outro beneficio importante foi a melhora da dinâmica dentro da equipe. No feedback final todos concordaram que a equipe funcionava muito melhor a partir das ferramentas de comunicação que foram aprendidas durante o programa. 4) Você é argentina, morou no Canadá e depois veio para o Brasil. De que maneira fato de não ser brasileira influenciou o seu treinamento? Foi importante para criar uma empatia diferente com os participantes. Durante a palestra falei com eles de minha experiência no Brasil como estrangeira, contei para eles como eu vivenciei alguns choques culturais de uma maneira bem parecida com eles tanto aqui como no Canada. A minha vivência é uma ferramenta importante nos meus treinamentos para explicar que não é o Brasil o problema e que uma parte das dificuldades que eles sentem é a necessidade de aprender, de mudar nossos paradigmas, de enxergar o “outro” a partir do “outro” e não de nossa visão do mundo própria de nossa cultura de origem. Compartilho com eles como crianças que já nascem multiculturais, como minhas filhas fazem de maneira natural e sem stress o que para nós é muito mais difícil e demanda treinamento e tempo. 5) Você provavelmente sofreu um choque cultural no Brasil. Quais características da cultura brasileira foram mais difíceis de lidar? E o que você vai levar de positivo do Brasil? Entendendo por cultura brasileira como um marco da resposta e não considerando a cultura brasileira como algo estático ou uniforme que todos os brasileiros compartilham. Cheguei no Brasil depois de 8 anos no Canadá e uma das maiores dificuldades foi a noção do tempo e da assertividade. No começo, nas fases emocionais da curva da mudança (na fase de negação, imobilidade ou raiva) sentia que para toda tarefa solicitada para alguém eu precisava pedir no mínimo duas vezes porque nada dava certo na primeira vez, o prometido não era cumprido e era impossível me organizar com os horários. O maior aprendizado para mim foi conseguir entender o que tem de bom na cultura brasileira, na noção do tempo e da assertividade. Esse primeiro choque cultural me permitiu trabalhar em profundidade em mim mesma as vantagens da flexibilidade em relação ao tempo e consegui acrescentar mais uma ferramenta neste sentido. E o mesmo com a assertividade, foi um trabalho intenso de conjugar como respeitar minhas necessidades focando na mensagem e na percepção do outro. 6) O que você absorveu da cultura canadense? No caso da cultura canadense foi bem diferente, o aprendizado veio mais da novidade que do choque cultural. Da cultura canadense absorvi a importância do sistema, da dinâmica do indivíduo em relação à sociedade, a importância de se envolver e do trabalho voluntário. Absorvi também uma maneira de ver a diversidade como fonte de crescimento, de desenvolvimento e não como um problema a resolver. Ainda com uma visão jurídica transformei a visão do peso e do valor dos direitos fundamentais e entrei no mundo do diálogo e das concessões razoáveis. Só para completar as perguntas, procurei absorver o lado positivo de cada cultura, de cada país, e ainda trago tudo que aprendi na minha terra natal, a Argentina. 7) Como foi a parceria que você estabeleceu com a SP Accueil? E como começou a participação da consulesa Alexandra Loras? Quando a Missão Paz estabeleceu o treinamento como obrigatório para os imigrantes serem aprovados nas entrevistas de emprego, o número de francófonos não parava de subir. Os treinadores que falavam francês eram poucos, o que dificultava dar conta das palestras. Assim, comecei a contatar de maneira informal pessoas da comunidade francesa de São Paulo que conhecia por meio da minha atividade profissional. Como eu tinha contato por outros projetos profissionais com a São Paulo Accueil, discuti sobre a experiência da Missão Paz com minha colega Catherine que se ocupava da solidariedade dentro da associação. Concordamos que sendo o objetivo da SPA acolher os francófonos que chegam em São Paulo, seria ideal estabelecer uma parceria com Missão Paz, que recebe uma grande quantidade de francófonos. Ela apresentou a ideia à direção da SPA e eu falei com o Padre Paolo, da Missão Paz. As duas partes ficaram empolgadas com a possível parceria e assim teve início uma primeira reunião entre eles. Esta parceria se traduz numa divulgação mensal das atividades da Missão Paz entre os mais de 400 associados francófonos da SPA em busca tanto de doações como de voluntários para colaborar. Logo na primeira publicação da newsletter da associação já apareceram voluntários. Em paralelo, surgiu com a Catherine e a Mariana a ideia de apresentar a Missão Paz para a consulesa da França. Mais uma vez a Alexandra mostrou suas qualidades pessoais e sua generosidade e me recebeu para discutir o tema. Uma reunião de uma hora com ela foi mais que suficiente para ela demostrar que não por acaso é uma referência na luta contra a discriminação da cultura negra no Brasil. A reunião foi além das nossas expectativas e ela decidiu se engajar pessoalmente com a Missão Paz, ministrando treinamentos e palestras e se envolvendo com a equipe de maneira direta. 8) Você vai morar em Paris. Pretende fazer alguma ponte com a Sietar de lá? Quais são os seus planos neste sentido? Vou continuar sem dúvida como membro da Sietar participando das atividades da Sietar França e Europa. Em relação à experiência com a Missão Paz, meu objetivo é apresentar o trabalho na França para sugerir uma reprodução do esquema de trabalho voluntário desenvolvido pela Sietar Brasil em associações onde treinamentos ou palestras interculturais colaborem com seus objetivos, seja em acolhida de imigrantes, luta contra a discriminação racial, religiosa ou similares. |
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